A educação infantil é uma fase crucial no desenvolvimento da criança, e nessa fase serão construídos os alicerces para o processo da alfabetização.
Devemos Alfabetizar na Educação Infantil?
A questão sobre alfabetização na Educação Infantil sempre gerou debates entre educadores, pais e especialistas, principalmente quando pensamos no desenvolvimento integral das crianças nessa fase tão crucial da vida.
A resposta para esse pergunta é: nesta fase escolar, é necessário estimular as habilidades preditoras que são essenciais para a alfabetização. Na educação infantil, não iremos alfabetizar, mas sim desenvolver a base para uma alfabetização de sucesso.
Com a crescente compreensão dos processos de aprendizagem, especialmente no que diz respeito à leitura, a ciência cognitiva da leitura tem se mostrado uma grande aliada na definição do que realmente devemos ensinar nesse período. A base para o desenvolvimento de habilidades de leitura começa muito antes da criança aprender a ler palavras de fato. O foco deve ser, então, em habilidades cognitivas que prepararam o cérebro para o aprendizado da leitura e da escrita.
O que Precisamos Ensinar na Educação Infantil?
A fase conhecida como pré-alfabetização refere-se ao tempo em que as crianças estão na educação infantil e adquirem conceitos essenciais sobre leitura e escrita, que são habilidades cruciais para o processo de alfabetização. Esse período corresponde a crianças de 4 e 5 anos (SARGIANI et al., 2022).
Neste estágio, os pequenos começarão a adquirir uma compreensão básica da leitura e da escrita, incluindo habilidades fonológicas como vocabulário, memória fonológica e nomeação, além de desenvolver a consciência fonológica e o princípio alfabético (SARGIANI et al., 2022; BRASIL, 2019).
Veremos cada uma dessas habilidades e orientações de práticas para o seu progresso (BRASIL, 2019).
1 – Vocabulário em Expansão: A Importância das Palavras na Educação Infantil (4 e 5 anos)

A educação infantil é um período de descobertas e aprendizado intenso para as crianças, e o desenvolvimento do vocabulário tem um papel fundamental nesse processo. Ampliar o repertório de palavras que as crianças de 4 e 5 anos conhecem e utilizam é crucial para a comunicação, o desenvolvimento cognitivo e o sucesso escolar futuro.
A Base para a Comunicação
Imagine uma criança tentando expressar suas ideias, sentimentos e necessidades sem ter as palavras adequadas para isso. A frustração seria inevitável! Um vocabulário rico permite que a criança se comunique de forma mais clara e eficaz, expresse suas vontades, compreenda instruções, participe de conversas e construa relações sociais mais significativas.
Impulsionando o Desenvolvimento Cognitivo na Educação Infantil
As palavras são como peças de um quebra-cabeça que a criança usa para construir o conhecimento sobre o mundo ao seu redor. Aprender novas palavras ajuda a criança a:
- Categorizar e organizar o mundo: ao aprender palavras como “mamífero”, “réptil” ou “inseto”, a criança começa a agrupar e classificar os animais, desenvolvendo habilidades de organização e pensamento lógico.
- Compreender conceitos abstratos: palavras como “felicidade”, “tristeza” ou “justiça” permitem que a criança explore emoções e ideias complexas, expandindo sua capacidade de compreensão do mundo.
- Desenvolver a imaginação e a criatividade: um vocabulário amplo fornece às crianças as ferramentas para criar histórias, expressar ideias originais e explorar diferentes mundos através da linguagem.
Sucesso na Alfabetização e no Aprendizado
O vocabulário é um dos pilares para o sucesso na alfabetização, e deve ser estimulado desde o início da educação infantil. Crianças com um vocabulário rico tendem a:
- Aprender a ler com mais facilidade: a familiaridade com as palavras facilita a decodificação e a compreensão de textos.
- Escrever de forma mais clara e expressiva: com mais palavras à sua disposição, a criança consegue se expressar de maneira mais precisa e criativa na escrita.
- Ter melhor desempenho escolar: um vocabulário amplo contribui para o sucesso em todas as áreas do conhecimento.
Como Desenvolver o Vocabulário na Educação Infantil?
- Converse com as crianças: faça rodas de conversa todos os dias, dialogue sobre diversos assuntos, utilize palavras novas e explique seus significados.
- Leia histórias em voz alta: a leitura expõe as crianças a uma variedade de palavras e estruturas gramaticais.
- Cante músicas e recite poemas: as rimas e a musicalidade auxiliam na memorização de novas palavras.
- Explore o mundo ao redor: faça passeios, visite museus e parques, converse sobre as experiências e incentive a criança a nomear objetos e descrever o que vê.
Desenvolver o vocabulário na educação infantil é um investimento valioso no futuro das crianças. Ao oferecer um ambiente rico em linguagem e oportunidades de aprendizado, estamos contribuindo para a formação de indivíduos comunicativos, criativos e preparados para os desafios do mundo.
2 – Memória Operacional Fonológica: Habilidade Essencial para a Alfabetização
O que é a Memória Operacional Fonológica?
A memória operacional fonológica (MOF) é um elemento da Memória de Trabalho, relacionado à retenção de informações linguísticas, que podem ou não ser registradas. Trata-se de um sistema que processa e mantém informações por um breve período, sendo necessário manipulá-las e repeti-las para que possam ser transferidas para a memória de longo prazo (BUZETTI e CAPELLINI, 2020; GRANZOTTI et al., 2013).
Dessa forma, podemos entender a MOF como uma memória de curto prazo dos sons da fala, que possui uma capacidade restrita. É por meio da MOP que conseguimos lidar com novas palavras durante o processo de decodificação (ZORZI e CAPELLINI, 2009 apud BUZETTI e CAPELLINI, 2020).
Imagine a memória operacional como um “bloco de notas mental”, um espaço temporário onde armazenamos e manipulamos informações. A memória operacional fonológica é a parte desse bloco de notas que lida especificamente com os sons da fala. Em resumo, ela nos permite:
Reter informações sonoras: guardar na mente os sons das palavras enquanto as ouvimos ou lemos.
Manipular sons: segmentar palavras em sílabas, identificar rimas, combinar fonemas para formar palavras.
A Importância na Alfabetização
A memória operacional fonológica é crucial para a alfabetização porque:
Permite a associação entre sons e letras: ao lembrar dos sons da fala, a criança consegue conectá-los às letras correspondentes, decifrando o código alfabético.
Facilita a decodificação de palavras: a criança consegue “quebrar” as palavras em sons individuais (fonemas) e juntá-los novamente para formar a palavra, possibilitando a leitura.
Auxilia na compreensão da leitura: ao armazenar as palavras lidas na memória operacional, a criança consegue construir o significado do texto.
Contribui para a escrita: a memória operacional fonológica ajuda a criança a lembrar da sequência de sons e letras para escrever as palavras corretamente.
Dificuldades na Memória Operacional Fonológica e Impacto na Alfabetização
Crianças com dificuldades na memória operacional fonológica podem apresentar:
- Dificuldade em aprender o alfabeto e os sons das letras.
- Problemas para ler e soletrar palavras.
- Lentidão na leitura e escrita.
- Dificuldade em compreender textos.
Como Estimular a Memória Operacional Fonológica na Educação Infantil?
Existem diversas atividades e jogos que podem auxiliar no desenvolvimento da memória operacional fonológica em crianças:
• Repetição de sequências: repetir sequências de números, palavras, sons ou objetos. A brincadeira “Fui ao mercado” é excelente, funcionando assim: cada criança irá dizer “Fui ao mercado e comprei…” e, sucessivamente, as demais crianças irão falar o que o amigo “comprou” e também irão “adicionar um item”.
• Leitura em voz alta: ler histórias em voz alta para as crianças, com entonação e ritmo, e logo em seguida fazer perguntas sobre o que foi acabado de ler.
• Narração de histórias: incentivar as crianças a contarem histórias, recontarem eventos do dia a dia e criarem suas próprias narrativas.
3 – Nomeação Automática Rápida: A Velocidade que Impulsiona a Leitura
Você sabia que a velocidade com que ela nomeia objetos, cores, letras e números tem um papel crucial nesse processo? Estamos falando da Nomeação Automática Rápida, uma habilidade cognitiva fundamental para o desenvolvimento da leitura fluente e eficiente.
O Que é Nomeação Automática Rápida?
A nomeação rápida é a habilidade de nomear o mais rápido possível uma sequência de estímulos visuais familiares (BRASIl, 2019), como:
- Cores: Vermelho, azul, verde, amarelo…
- Objetos: Casa, bola, árvore, carro…
- Letras: A, B, C, D…
- Números: 1, 2, 3, 4…
Essa habilidade reflete a eficiência com que o cérebro recupera informações da memória e as conecta com a linguagem oral.
A Importância para a Alfabetização
A Nomeação Automática Rápida é como um motor potente que impulsiona o desenvolvimento da leitura. Ela influencia diretamente:
- Fluência na leitura: permite que a criança acesse rapidamente o nome das letras e palavras, tornando a leitura mais fluida e automática.
- Decodificação: ao nomear as letras com rapidez, a criança consegue decodificar as palavras com mais facilidade, juntando os sons e formando a pronúncia correta.
- Compreensão da leitura: quando a criança não precisa se esforçar para decodificar as palavras, ela pode dedicar mais atenção à compreensão do texto.
- Escrita: também contribui para a escrita, facilitando a recuperação das letras e a organização das palavras no papel.
Como Estimular a Nomeação Automática Rápida na Educação Infantil?
Existem diversas atividades e jogos que podem auxiliar no desenvolvimento dessa habilidade:
- Jogos de cartas com figuras, cores, letras ou números: nomear os elementos das cartas o mais rápido possível.
- Utilizar flashcards: mostrar flashcards com diferentes estímulos e pedir para a criança nomeá-los rapidamente.
- Leitura em voz alta: Ler textos em voz alta, incentivando a criança a acompanhar a leitura e nomear as palavras.
- Jogos de tabuleiro: jogos que envolvam a nomeação de elementos, como “Banco Imobiliário” ou “Jogo da Vida”.
4 – Consciência Fonológica: O Alicerce da Alfabetização

Entre as habilidades necessárias, destaca-se a consciência fonológica, uma capacidade fundamental para que a criança compreenda a relação entre os sons da fala e a escrita. Sem ela, a jornada rumo à leitura e escrita pode se tornar um caminho tortuoso e desafiador.
O que é Consciência Fonológica?
A consciência fonológica é a habilidade de perceber, manipular e refletir sobre os sons da fala (BRASIL, 2019). Para crianças de 4 e 5 anos, é importante que elas comecem a trabalhar com as diferentes habilidades da consciência fonológica desde a educação infantil, que são fundamentais para o entendimento de como as palavras são estruturadas. Essas habilidades incluem:
- Consciência de Rimas: a habilidade de perceber e produzir palavras que rimam. As rimas ajudam as crianças a ouvir e segmentar os sons das palavras, o que é essencial para o reconhecimento de padrões fonológicos.
- Consciência de Aliterações: trata-se da capacidade de identificar e produzir palavras que compartilham o mesmo som inicial, como “pato” e “passo” ou “uva” e “urubu”. A aliteração ajuda as crianças a se familiarizarem com a correspondência entre sons e letras, facilitando o processo de leitura.
- Consciência de Frases e Palavras: a capacidade de perceber que uma frase é composta por várias palavras.
- Consciência de Sílabas: envolve a habilidade de identificar e manipular sílabas dentro das palavras. Ao trabalhar com sílabas, as crianças aprendem a perceber a estrutura das palavras e a desenvolver um entendimento inicial da segmentação fonológica.
- Consciência Fonêmica: a habilidade mais avançada da consciência fonológica, que se refere à capacidade de identificar e manipular os fonemas (os sons mais pequenos da fala) dentro das palavras. A consciência fonêmica permite que as crianças comecem a associar sons específicos às letras correspondentes, o que é essencial para o processo de alfabetização.
Escrevi um artigo focado nas habilidades da Consciência Fonológica, se desejar ler clique aqui!
5 – O Princípio Alfabético: A Chave Para a Leitura e Escrita
Para que a criança desvende o código da leitura e escrita, é preciso dominar o Princípio Alfabético, um conceito fundamental amplamente estudado pelo renomado pesquisador José Morais. Em seu livro Em seu livro “Criar leitores (2013)”, o autor aborda amplamente esse assunto
Decodificando o Princípio Alfabético
O Princípio Alfabético é a compreensão de que a escrita alfabética é um sistema de representação da fala, onde as letras representam os sons (fonemas) da língua. Dominar esse princípio significa:
- Conhecer as letras: identificar cada letra do alfabeto, seu nome e som.
- Compreender a correspondência fonema-grafema: entender que cada letra ou conjunto de letras representa um som específico na fala.
- Decodificar palavras: utilizar o conhecimento das letras e seus sons para ler palavras, juntando os fonemas e formando a pronúncia.
- Codificar palavras: utilizar o conhecimento das letras e seus sons para escrever palavras, segmentando a palavra em fonemas e escolhendo as letras correspondentes.
Como Ensinar o Princípio Alfabético na Educação Infantil
Com base nos estudos de José Morais, algumas estratégias eficazes para ensinar o Princípio Alfabético são:
- Ensino explícito das relações fonema-grafema: apresentar as letras e seus sons de forma clara e sistemática, utilizando jogos, atividades e materiais concretos.
- Leitura de histórias em voz alta: a leitura em voz alta, com entonação e ritmo, expõe a criança aos sons da língua e à correspondência entre fala e escrita.
- Atividades de consciência fonológica: jogos e brincadeiras que trabalham a identificação, segmentação e manipulação dos sons da fala.
Se desejar saber mais sobre José Morais, clique aqui. Esta matéria aborda os pensamentos do autor.
CONCLUSÃO
O foco na educação infantil não é alfabetizar a criança, mas sim o estímulo às habilidades preditoras da leitura e escrita, especialmente para crianças de 4 e 5 anos.
As habilidades preditoras mencionadas anteriormente são fundamentais para que as crianças compreendam de forma eficaz os sons, as palavras e a estrutura da linguagem.
Ao estimular essas habilidades precoces, os educadores contribuem diretamente para a construção de um processo de alfabetização mais fluido e significativo. Quando as crianças dominam essas habilidades, elas conseguem antecipar padrões, identificar sons e associá-los às letras, o que facilita a aprendizagem das letras e palavras.
Para garantir que essas habilidades sejam trabalhadas de forma eficaz, é essencial que a metodologia adotada seja lúdica e adaptada à faixa etária, promovendo atividades dinâmicas que envolvam brincadeiras, músicas, contação de histórias e jogos interativos. Nesse sentido, o papel dos educadores é crucial, pois eles devem identificar as necessidades de cada criança e criar estratégias que despertem o interesse e a curiosidade pela aprendizagem da leitura e escrita.
Portanto, a prática de trabalhar as habilidades preditoras desde os primeiros anos de escolaridade não apenas contribui para um processo de alfabetização mais rápido e eficiente, mas também prepara as crianças para os desafios da aprendizagem ao longo de sua vida escolar. Essa abordagem ajuda a criar uma base sólida, fortalecendo a autoestima e a motivação das crianças para que continuem seu caminho de aprendizagem com confiança e curiosidade.
Querido(a) leitor(a), quantas informações valiosas, não é mesmo? Na nossa jornada profissional, é fundamental estudarmos diariamente para garantir o melhor ensino para os nossos pequenos, especialmente na educação infantil, um período crucial para o desenvolvimento de habilidades que refletirão ao longo de toda a vida!
Ficarei muito feliz em saber suas opiniões. Escreva nos comentários!
Esse artigo foi escrito com muito carinho e atenção, e espero que tenha gostado! Abraço!
Referências
BRASIL, PNA: política nacional de alfabetização. Brasília: MEC, 2019.
BUZETTI, Miryan Cristina. CAPELLINI, Simone Aparecida. Habilidades Preditoras para Alfabetização: Contribuições Para a Sala de Aula. 1 ed. Ribeirão Preto, SP: Book Toy, 2020.
MORAIS, J. Criar leitores: para professores e educadores. São Paulo: Manole, 2013.
SARGIANI, R. Alfabetização baseada em evidências: como a ciência cognitiva da leitura contribui para as práticas políticas educacionais de literacia. In: SARGIANI, R. Alfabetização baseada em evidências: da ciência à sala de aula. Porto Alegre: Penso, 2022