As birras são um comportamento esperado em crianças pequenas. Embora possam ser desafiadoras para os pais e cuidadores, compreender suas causas e saber como lidar com elas pode tornar o dia a dia mais tranquilo. Neste artigo, exploraremos os motivos por trás das birras, como reagir de forma eficaz e estratégias para manter a calma diante dessas situações.
O que são birras e por que acontecem?1
As birras são explosões emocionais que ocorrem quando a criança se sente frustrada, cansada ou incapaz de expressar suas necessidades de outra forma. Esse comportamento faz parte do desenvolvimento infantil, pois nessa fase as crianças ainda estão aprendendo a lidar com emoções e a desenvolver habilidades de comunicação.
A razão primordial para as crises de birra, refere-se ao desenvolvimento ainda não completo do nosso cérebro ao nascer. É necessário entender que o cérebro da criança ainda não está totalmente desenvolvido. Isso implica que, ao nascermos, certas áreas do cérebro permanecem incompletas.
É importante mencionar pelo menos uma dessas regiões, e uma dessas áreas que será aprimorada conforme o desenvolvimento será o neocórtex, a parte superior da massa cinzenta. Essa área, que é a mais nova em termos de evolução, tem um papel fundamental em competências essenciais para a autonomia do ser humano, como o raciocínio, a reflexão, a criatividade, a solução de problemas e o planejamento. As birras das crianças podem ser interpretadas como uma manifestação da ativação da parte mais rudimentar do cérebro, especificamente da região inferior. No entanto, é importante frisar que as birras, como as conhecemos, vão além de uma simples demonstração de descontentamento diante de uma frustração.
Até os quatro anos de idade, a desconexão na mente das crianças tem um agravante: os dois hemisférios do cérebro ainda não funcionam de maneira completamente integrada. Se você já teve contato com uma criança pequena – seja seu filho, um sobrinho ou até aquele menino barulhento do andar de cima – certamente notou que, até essa idade, as crises de raiva parecem intermináveis.
Nesse estágio, as fibras mielinizadas no corpo caloso, que interliga os dois hemisférios cerebrais, ainda são insuficientes. Mais ou menos o que se observa em crianças com menos de quatro anos, sendo que este lado do cérebro é preponderante. Elas ainda não possuem a capacidade de usar a lógica e as palavras para expressar o que sentem, vivendo inteiramente o momento presente. Essa intensa carga emocional é o que pode justificar a choradeira excessiva de uma criança simplesmente porque você não permitiu que ela brincasse com um objeto na casa que estiveram visitando.
Causas das Birras
As birras geralmente ocorrem no período em que as crianças estão desenvolvendo habilidades de comunicação e autonomia.
Fatores que contribuem para as birras incluem:
Falta de habilidades de comunicação: Muitas crianças pequenas ainda não sabem expressar seus sentimentos e desejos com palavras, o que pode gerar frustração.
Cansaço ou fome: quando a criança está muito cansada ou com fome, as chances de uma birra acontecer é bem alta.
Desejo de independência: crianças pequenas estão começando a explorar sua autonomia e podem se frustrar quando não conseguem fazer algo sozinhas.
Necessidade de atenção: em alguns casos, as birras são uma forma de chamar a atenção dos pais ou cuidadores.
Frustração com limites e regras: à medida que aprendem sobre limites, é comum que crianças pequenas resistam a regras e restrições.
Como Lidar com as Birras de Forma Eficaz?
De acordo com o pediatra Daniel Siegel (2015)2, quando uma criança estiver em uma crise de birra, ou seja, quando o hemisfério direito está em destaque, é mais eficaz abordá-la de maneira emocional. Assim que a birra começar, ofereça um abraço, mostre expressões faciais que demonstrem empatia e use um tom de voz afetuoso. Ajude-a a nomear os sentimentos que ela não consegue expressar – já que seu hemisfério esquerdo, responsável pela linguagem, não está ativo.
Utilize frases como: “Eu compreendo que você está muito triste porque seu amigo teve que ir embora. É realmente frustrante quando isso acontece”. Isso ajudará a acalmá-la. Em seguida, incentive-a a reconectar-se com o hemisfério esquerdo pedindo que explique verbalmente o motivo da sua chateação e sugira alternativas para solucionar a situação. Você pode perguntar: “O que você acha que podemos fazer para nos divertirmos novamente? Que brincadeiras poderíamos fazer juntos?”.
Lembre-se que até os quatro anos, a atividade do hemisfério esquerdo do cérebro, que está relacionado ao raciocínio lógico, ainda é bem restrita. Por isso, tentar argumentar com uma criança nessa faixa etária não tem o efeito esperado. Não vale a pena perder tempo tentando explicar ou discutir racionalmente com ela.
De forma resumida, seguem alguns comportamentos que podem ajudar a lidar com as birras:
As birras fazem parte do desenvolvimento
Lembrar-se disso pode ajudar a evitar frustrações excessivas.
Mantenha a Calma
O primeiro passo para lidar com uma birra de forma eficaz é manter a calma. Quando uma criança está em crise, é natural que os pais ou educadores se sintam frustrados. No entanto, demonstrar calma transmite segurança à criança. Respire fundo, tente não reagir de forma impulsiva e evite gritar ou se envolver em discussões durante a birra. Lembre-se: a criança está aprendendo a lidar com seus sentimentos, e você também pode ensinar através do seu comportamento.
Entenda o Motivo da Birra
Tente compreender o que está por trás da birra. A criança pode não ser capaz de expressar verbalmente o que está sentindo, mas você pode tentar identificar sinais como cansaço, fome, irritação ou desejo de atenção. Quando a causa é identificada, fica mais fácil agir de maneira direcionada, seja oferecendo um lanche, uma pausa ou simplesmente oferecendo consolo.
Defina Limites Claros e Consistentes
A consistência é chave. Quando a criança percebe que as regras e limites são claros e constantes, ela se sente mais segura. Se a birra é causada por um desejo não atendido, explique de forma calma que aquela ação não é possível no momento. Tente ser firme, mas sempre com empatia. Se você ceder a crise de birra, a criança irá aprender que com esse comportamento ela terá o que deseja, o que pode resultar em birras mais frequentes no futuro.
Redirecione a Atenção
Uma estratégia eficaz para interromper uma birra é redirecionar a atenção da criança. Isso pode ser feito através de uma atividade que a envolva, como um jogo, um brinquedo ou até mesmo uma mudança de ambiente. Mudar o foco da criança para algo positivo pode ajudá-la a esquecer a frustração que causou a birra.
Envolva a Criança na Solução
Após a birra ter cessado, converse com a criança sobre o que aconteceu. Pergunte como ela se sentiu e ofereça alternativas para que ela possa lidar com a situação de uma forma mais tranquila na próxima vez. Isso ajudará a criança a entender que a birra não é a única forma de expressar seus sentimentos. Ensinar a ela que é possível pedir ajuda ou comunicar suas emoções de maneira mais apropriada é uma maneira eficaz de prevenir futuras birras.
Use Técnicas de Distração
Algumas crianças se acalmam facilmente com atividades que distraem sua mente e corpo. A música, por exemplo, pode ser uma ótima maneira de aliviar a tensão e ajudar a criança a relaxar. Outra opção é fazer um desenho, contar uma história ou envolver a criança em uma atividade física, como pular ou dançar, para liberar a energia acumulada de forma positiva.
Evite Reforçar Comportamentos Negativos
Se você ceder à birra para evitar o desconforto do momento, a criança aprenderá que esse comportamento é eficaz. Portanto, evite recompensar a birra com o que a criança deseja, como um doce ou brinquedo, caso não seja um pedido adequado. Em vez disso, mostre à criança que boas atitudes e comportamentos são recompensados, enquanto as birras não levam a resultados positivos.
Seja Paciente e Empático
Lembre-se que as birras são uma fase natural do desenvolvimento infantil. Ter paciência e ser empático ao lidar com esses episódios é essencial. Crianças pequenas ainda estão aprendendo a lidar com suas emoções, e você pode ser um modelo para ela, mostrando como administrar sentimentos de frustração e raiva de forma construtiva.
Valide os sentimentos da criança
Demonstre empatia e diga frases como: “Eu sei que você está frustrado porque queria aquele brinquedo”. Isso facilita a criança a se sentir mais compreendida e valorizada.
Ofereça opções
Dar escolhas dentro de limites pode ajudar a evitar birras. Por exemplo, em vez de dizer “Você tem que vestir essa roupa”, tente “Você quer usar a blusa azul ou a vermelha?”.
Ensine habilidades emocionais
Ajude a criança a identificar e nomear suas emoções. Livros infantis sobre sentimentos podem ser uma excelente ferramenta para esse aprendizado.
Quando Devo Me Preocupar Com As Crises De Birras
Como vimos durante o artigo, as crises de birra fazem parte do desenvolvimento infantil e são comportamentos comuns entre crianças pequenas, especialmente entre 1 e 4 anos. Elas surgem geralmente como uma forma de expressão de frustração, dificuldade de comunicação ou até mesmo cansaço. Embora seja normal que as crianças se irritem ou fiquem chateadas de vez em quando, existem situações em que os pais e educadores precisam ficar mais atentos, principalmente quando as birras se tornam frequentes e intensas.
Uma das primeiras coisas a se considerar é a frequência e a intensidade dessas crises. Se a criança estiver tendo diversas crises de birras quando algo não sai como ela deseja, ou se o comportamento for muito explosivo, com gritos, choros ou até mesmo de forma agressiva, é importante observar mais de perto o que está acontecendo. Uma criança que se irrita frequentemente pode estar enfrentando dificuldades maiores do que simplesmente aprender a lidar com a frustração. Nesse caso, pode ser necessário buscar ajuda para entender melhor o que está por trás dessa reação.
Outro aspecto importante é a duração das birras. Quando as crises se prolongam por mais tempo do que o esperado para a faixa etária, ou quando a criança tem dificuldade em se acalmar sozinha, é hora de se preocupar. Isso pode indicar que ela ainda não desenvolveu totalmente as habilidades emocionais necessárias para lidar com as frustrações do dia a dia. Em alguns casos, isso pode ser um sinal de que a criança está lidando com questões emocionais mais profundas, como insegurança ou ansiedade, que precisam ser abordadas.
O contexto também é relevante. Se as crises de birra ocorrerem em momentos inesperados, como durante atividades do cotidiano que antes não causavam esse tipo de reação, pode ser necessário investigar se há algo fora do normal na rotina da criança, como mudanças no ambiente, novas experiências ou até mesmo problemas de saúde que podem estar interferindo no seu comportamento.
Além disso, vale a pena observar a reação da criança após a birra. Crianças que conseguem se acalmar rapidamente e aprender com o ocorrido normalmente não apresentam grandes dificuldades para voltar à sua rotina. No entanto, se a criança continuar com dificuldades em se adaptar ou demonstrar um padrão de comportamento agressivo ou desafiante após uma crise de birra, isso pode ser um sinal de alerta.
Outro fator importante a ser considerado é a capacidade de autocontrole da criança. Crianças que têm mais dificuldade em expressar suas emoções de maneira adequada podem mostrar um padrão de comportamentos impulsivos ou descontrolados, como as birras frequentes. Isso pode ser uma indicação de que ela está tendo dificuldades no desenvolvimento emocional, e a intervenção de um especialista pode ser necessária.
Por fim, é importante lembrar que as birras podem ser uma forma de comunicação. Elas não devem ser encaradas como uma simples manipulação, mas sim como um reflexo de uma necessidade não atendida. Quando a criança não sabe expressar o que está sentindo, ela pode usar comportamentos como birras para chamar a atenção ou tentar controlar uma situação. Por isso, os pais e educadores devem ser pacientes, compreensivos e tentar ajudar a criança a aprender outras formas de lidar com suas emoções.
Se as birras se tornarem uma preocupação constante, afetando o desenvolvimento social ou emocional da criança, ou se estiverem associadas a outros comportamentos desafiadores, buscar orientação de um profissional da área de saúde, como um psicólogo infantil, pode ser um passo importante para entender as causas e ajudar a criança a desenvolver maneiras mais saudáveis de lidar com suas frustrações.
Conclusão: Como Lidar com as Birras de Forma Consciente3
As birras são comportamentos comuns no desenvolvimento infantil, sendo uma maneira dos pequenos expressarem suas frustrações, desejos e limitações. Elas ocorrem mais frequentemente entre os 2 e 4 anos, período em que as crianças estão aprendendo a lidar com suas emoções e a desenvolver a autonomia. Entender o que são as birras e por que elas acontecem é essencial para lidar com essas crises de maneira eficaz.
Primeiramente, é importante compreender que as birras são uma forma de comunicação. Quando as crianças ainda não têm domínio sobre a linguagem ou sobre como regular suas emoções, elas recorrem a comportamentos explosivos para tentar expressar suas necessidades. Isso pode ocorrer por vários motivos, como cansaço, fome, frustração ou até mesmo o desejo de testar os limites. Por isso, as birras não devem ser vistas como “rebeldia” ou “maldade”, mas sim como uma fase do desenvolvimento natural.
Para lidar com as birras de forma eficaz, é essencial manter a calma e agir com paciência. Ignorar o comportamento, oferecer alternativas de expressão e reforçar comportamentos positivos são algumas estratégias que ajudam a criança a entender que as birras não são uma forma produtiva de comunicação. Além disso, estabelecer rotinas consistentes e claras também contribui para reduzir a frequência desses episódios, pois as crianças se sentem mais seguras e sabem o que esperar.
No entanto, é importante estar atento à intensidade e frequência das birras. Se elas se tornarem recorrentes, agressivas ou acompanhadas de outros comportamentos prejudiciais, pode ser um sinal de que algo mais está acontecendo. Quando as birras estão afetando o bem-estar emocional ou social da criança, é recomendável buscar orientação de um profissional especializado, como um psicólogo infantil, para investigar se há questões subjacentes que precisam ser abordadas.
Em síntese, as birras fazem parte do desenvolvimento infantil, porém a maneira que lidamos com essas crises podem influenciar diretamente o comportamento da criança. Ao praticarmos paciência, empatia e consistência, podemos ensinar as crianças a lidar com suas emoções de forma mais saudável, preparando-as para uma convivência mais equilibrada e harmoniosa.
*Se você quiser saber mais sobre crianças de 0 a 3 anos, visite a categoria de artigos voltada para essa faixa etária. Clique aqui!
Referências
- CHILD PSYCHOTHERAPY TRUST. Understanding Childhood. Reino Unido: Child Psychotherapy Trust. Disponível em: <www.understandingchildhood.net>. Acesso em: 11 fev. 2025. ↩︎
- SIEGEL, Daniel J.; BRYSON, Tina. O cérebro da criança: 12 estratégias revolucionárias para nutrir a mente em desenvolvimento do seu filho e ajudar sua família a prosperar. 1. ed. São Paulo: nVersos, 2015. ↩︎
- VIEIRA, V. A ciência contra a birra. Superinteressante, São Paulo, 2 fev. 2013. Disponível em: https://super.abril.com.br/comportamento/a-ciencia-contra-a-birra/. Acesso em: 11 fev. 2025 ↩︎
